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27 de abril de 2004

Morgado propõe publicitação de processos e condenações por corrupção

A propósito do Colóquio Corrupção/Cidadania Activa, com a participação de Maria José Morgado e Luís Salgado Matos
inserido no ciclo SETE PECADOS SOCIAIS / SETE SINAIS DE ESPERANÇA

Público, 17.Mar.04
Nuno Sá Lourenço


A juíza e ex-responsável da Polícia Judiciária, Maria José Morgado, defendeu ontem num colóquio a necessidade do Ministério da Justiça começar a fazer "publicidade periódica de notificações de operações suspeitas, processos, acusações e condenações ao nível do combate à corrupção". A autora do livro "Inimigo sem rosto - fraude e corrupção em Portugal" falou no Centro Nacional de Cultura, em Lisboa, sobre esse tema, tendo tido como co-orador o investigador universitário Luís Salgado Matos.

Entre as áreas abordadas, a ligação da política à corrupção foi dos mais debatidos. Depois de desafiada por Luís Salgado Matos a responder se existia falta de oferta política no combate ao fenómeno, a magistrada reconheceu "um grande fosso entre a preocupação política [com a corrupção] e os actos".

A inexistência de publicitação das investigações foi um exemplo dessa discrepância entre o discurso político e a sua conduta. Daí que Maria José Morgado tenha defendido a premência de "fazer uma estatística semestral ou anual [dos casos detectados] sem pôr em causa o bom nome das pessoas" A "falta de actuação da fiscalização em tempo real" foi outra das deficiências apontadas e "maus métodos de trabalho e más direcções", as razões apontadas para ausência de fiscalização eficiente. Sobre os métodos assinalou a "ausência de cruzamento de dados", a "impossibilidade de investigação a partir de sinais exteriores de riqueza", o "não acesso às contas bancárias", e a falta de "promoção pelo mérito". Aqui o dedo voltou a ser apontado aos políticos. A juíza afirmou que "enquanto as nomeações para as direcções fossem feitas por cartão partidário não teremos bons resultados".

O debate chegou também ao financiamento partidário, com a magistrada a defender "a demissão do líder partidário e o seu afastamento de qualquer cargo público durante uns anos". "Seria muito mais sério funcionar dessa forma, em vez de ter que se esperar pelo andamento de um processo-crime [tal como a lei prevê actualmente]", defendeu. Sobre o impacto da corrupção, e depois de questionada por Luís Salgado Matos sobre se o país não estaria a pintar um quadro demasiado negro da situação, Maria José Morgado foi buscar um exemplo para sustentar a análise "preocupante" que fez. "Hoje são os próprios empresários que reivindicam o fim do sigilo bancário, porque a corrupção só favorece a economia paralela". Maria José Morgado destacou ainda os efeitos negativos na economia ao lembrar que "a corrupção entra no bolso de cada um". Deu alguns exemplos: "Nós estamos a pagar auto-estradas mais caras por causa da corrupção. A corrupção pode até fazer aumentar o preço dos medicamentos." Maria José Morgado não se limitou a criticar o poder político, tendo considerado negativo o facto dos tribunais julgarem poucos casos. A juíza apresentou como um dos problemas no combate à corrupção "não termos o efeito disciplinador, pedagógico dos tribunais". "Falta esse barómetro", queixou-se a magistrada.

A meio do debate tentou mesmo defender a necessidade do combate à corrupção com uma comparação caseira: "A corrupção é como o pó numa casa. Pó vamos ter sempre, mas se deixamos de limpar, então é o caos."

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