A CRISE EUROPEIA E O FUTURO DE
PORTUGAL
QUE PAPEL PARA A IGREJA CATÓLICA?
Viriato Soromenho-Marques
(Universidade de Lisboa)
Lisboa, Centro de Reflexão Cristã, 24 03 215
Sumário
1.Estamos melhor, em Portugal e na Europa, com a política de austeridade?
2. Foi o despesismo dos Estados que nos conduziu até aqui?
3.Que poderá fazer a Igreja Católica?
2. A trajectória da dívida pública
• 2001: 51%
• 2007: 68%. Em 7 anos aumentou 17 pp.
• 2011-2014: 94%-130%. Aumentou 36 pp em 3 anos. Um ritmo de aumento 4x mais rápido que no período anterior.
• Repare-se ainda que no Memorando de Entendimento a “Troika” considerava que o tecto máximo da dívida pública seria 114, 9%. Isto é, ainda antes do fim do Memorando nota-se um desvio de 15 pp!
É a dívida sustentável?
Efeito do saldo primário: está a evoluir positivamente, mas com custos enormes.
Efeito juros: Apesar da baixa recente a taxa de juro média é cerca 4%. Sangria estrutural no OE, implicando défice.
Efeito PIB: recuo acumulado do PIB de 6,5%, faz aumentar mais a dívida (que se avalia em relação ao PIB).
Outros: receitas extraordinárias e custos do sector empresarial do Estado et alia.
4. Pode a política de austeridade salvar o país?
Em 2010, 2,3 milhões de famílias (48% do total) recebiam menos de 10 mil euros. Em 2012 eram já 3 milhões, 66% do total (i, 22 02 2014).
Consumo público: no 1T de 2013 tínhamos os níveis de 2002.Consumo privado, recuámos a 2000.
5. Quanto ao nível de investimento, temos de recuar até 1987-88.
Mais de 300 000 emigrantes, desemprego histórico…
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6. A desigualdade também disparou na União Europeia.
Dados inquietantes do Household Finance and Consumption Survey (2006-2013):
Áustria: 5% mais ricos controlam 50% dariqueza e os 50% mais pobres apenas 4%.
Alemanha: entre 1998 e 2008 os 10% mais ricos subiram de 45% para 53% da riqueza nacional e os 50% mais pobres passaram de 4% para 1%!
7. A política da crise fez a pobreza alastrar na Europa 3 milhões de espanhóis recebem ajuda
alimentar da Cruz Vermelha.
Na Roménia 14% da população vive em pobreza absoluta e 40% em pobreza relativa.
Na Grécia a quebra de 25% do PIB nos últimos 5 anos tem sido devastadora.
Yves Daccord, Director do Comité Internacional da Cruz Vermelha, afirmou que a ajuda alimentar da organização é a maior desde a II GM.
9. Foi o despesismo dos Estados que nos conduziu até aqui?
“Um defeito no modelo de funcionamento do mundo actual”
> 23 10 2008: Alan Greenspan, 82, interrogado no Congresso sobre o colapso do Lehman e a bolha do “sub-prime” reconheceu ter errado ao pensar que os bancos agiriam para defender os accionistas e as instituições, e também ao não intervir contra os cinco anos de bolha imobiliária: “a flaw in the model ... that defines how the world works.”
10. Desde 1970 que construímos um monstro financeiro…acima da lei Ao nível planetário o 1% mais rico aumentou o seu rendimento em 60% desde 1990. Bankia; Anglo-Irish; ING; BPN…crimes sem castigo Os mais ricos teriam (2010) em paraísos fiscais 32 biliões (milhões de milhões) de dólares (mais do
que o PIB conjunto dos EUA e Japão. Na UE a evasão fiscal ultrapassa o PIB da Espanha. A banca sombra movimentou 67 biliões de $US em 2011 (111% do PIB mundial).
11. A culpa da crise é de credores e devedores
• “By deciding that the crisis was largely fiscal, policy makers could ignore the truth that the underlying cause of the disarray was irresponsible cross-border lending, for which suppliers of credit are surely as responsible as users. If the culpability of both sides – lenders and borrowers – had been understood, the moral case for debt write-offs would have been clearer.”, Martin Wolf, FT, 18 06 2013• A UEM é co-responsável.
12. Diagnósticos errados
• “Dívida soberana”? Só na Grécia…
• Em Portugal, o sector privado tem uma dívida superior ao Estado…
• Na Irlanda, foi a banca que arruinou o Estado.
• O Japão tem quase o dobro da dívida pública da Itália, e não ameaça falência…
• O absurdo da lógica: “primeiro saneiam-se as finanças e depois logo se fala de integração
política…”
13. Uma crise bancária causou a crise soberana
Countries/Areas: 2007 2008 2009 2010
Increase variation (p.p.)
Germany 65,2% 66,8% 74,5% 82,5 % 17,3
Portugal 68,4% 71,7% 83,7% 94% 25,6
Ireland 24,9% 44,2% 64,4% 91,2 % 66,3
Greece 107,4% 112,9% 126,7% 148,3 % 40,9
Eurozone (17) 66,4% 70,2% 80,0% 85,4 % 19
European Union (27) 58,9% 62,2% 74,5% 80,0 % 21,1
14. Government Debt in Portugal. Or the image of a failed bail out of a country based in austerity policies (Mark Blyth, Lisbon, 07 10 2014):
16. Diagnóstico sistémico
A UNIÃO ECONÓMICA e Monetária sofre de um defeito genético, que mesmo numa Europa de
anjos conduziria ao desastre. Uma União que arranca aos seus Estados-membros o poder soberano sobre a emissão de moeda e sobre o seu valor (poder cambial), sem criar uma soberania partilhada nos domínios fiscal, orçamental e da governação económica, é uma quimera monstruosa. A crise europeia não é uma crise económica e financeira, mas sim uma crise das políticas económicas e financeiras.
17. Ainda muito longe da terapiasistémica
• Um “federalismo” monetário sem federalismo político e orçamental, legitimado popular e constitucionalmente, é uma empresa condenada ao suicídio. É aqui, nas deficiências de software
político e constitucional, que se encontra, para a escola sistémica, tanto a raiz da crise europeia como a chave federal para a sua solução.
Esta Zona Euro agrava a desigualdade. O resultado destas falhas estruturais é claramente visível na distribuição do desemprego, com os Deficitários, representando menos de 20% da economia e um quarto da população activa, a concentrarem actualmente quase metade do desemprego de toda a área do euro.
Enquanto os Excedentários, pesando mais de 40% na economia e na população activa total, têm apenas 20% do desemprego de toda a área (em 2008 tinham 34,4%). Vítor Bento, 08 02 2015.
18. Que poderá fazer a Igreja Católica?
19. Denunciar a desumanidade...
Feita contra todas as recomendações do melhor saber económicos e das ciências sociais:
Robert Mundell, “A Theory of Optimum Currency Areas”, The American Economic Review, Volume 51, Issue 4 (Sep., 1961), 657-665. A questão da diferença entre “flexible and fixed exchange rates”.
Nicholas KALDOR, ”The Dynamic Effects Of The Common Market”, first published in the New Statesman, 12 March 1971.
20... desta Zona Euro
THE ROLE OF PUBLIC FINANCE IN EUROPEAN INTEGRATION
(Relatório McDougall) 1977
A austeridade está a pedir demasiado às pessoas, num quadro de violência social e injustiça (a transferência de riqueza da periferia para o centro). O Tratado Orçamental rompe com a tradição democrática europeia.
• Urgência; com 12 países, o Tratado entra
em vigor (artigo 14º).
• Chantagem: os Estados que não ratifiquem o novo Tratado ficam sem acesso ao Mecanismo Europeu de Estabilidade (considerando 5 do Tratado MEE e considerando 23 do Novo Tratado).
Apelar à dimensão política do perdão.
Depois de todas as cicatrizes reabertas, que fazem sangrar antigos medos e velhos ódios, a Igreja Católica tem a autoridade moral de chamar os Europeus à reconciliação (só o perdão permite romper com a vertigem da retaliação que a irreversibilidade do mal produz na acção humana), na base de valores espirituais (sagrados e profanos) comuns.
23. Transformar o medo em coragem
Nenhuma das tarefas que afectam os povos e indivíduos poderá ser melhor realizada no quadro do Estado nacional do que numa Europa unida na base do respeito pelas pessoas e pela Criação.
Evitar a guerra, construir a paz; 2. Economia solidária e ambientalmente sustentável; 3. Combater as ameaças globais (das alterações climáticas aos terrorismos).
• “Esses poderes públicos dotados de autoridade no plano mundial e de meios idóneos para alcançar com eficácia os objectivos que constituem os conteúdos do bem comum universal, devem ser constituídos de comum acordo entre todos os povos e não com a imposição da força”
• Pacem in Terris, § 44, p. 64.
Viriato Soromenho Marques
www.viriatosoromenho-marques.com
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