O CRC é um espaço de diálogo entre cristãos de diferentes sensibilidades, e entre cristãos e não cristãos.

Escutar a Cidade - Documento Final

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Procurando centrar estes nossos contributos na resposta às principais interpelações que nos foram feitas, organizámos este documento sob os seguintes tópicos:

1.     O dever de partilhar o que vivemos, vemos, ouvimos e lemos no tempo atual


2.     Prioridades diocesanas de reflexão e ação

a)    Erradicar a pobreza;

b)    Fomentar a justiça e a participação, novos nomes da Democracia;

c)     Falar as linguagens da arte, como questionamento e criação.


3.     Um novo modo de estar

a)    Fidelidade à ideia de universalidade cristã;

b)    Pluralidade na cidade e na Igreja;

c)     Libertar o futuro;

d)   A centralidade da palavra bíblica.


4.     Nós também excluímos


5.     Saber acolher, aceitar ser acolhida


6.     A expetativa dos nossos concidadãos

1. Partilhar o entendimento que, enquanto Igreja diocesana, fazemos sobre o que vivemos, vemos, ouvimos e lemos 

O “sonho missionário de chegar a todos” exige à Igreja que está emLisboa o dever de partilhar com os habitantes deste território a leitura que faz das realidades que estamos todos a viver. Em consequência, ela deve explicitar os aspetos merecedores da sua primordial atenção, bem como as prioridades de reflexão e de ação que elege a partir dessa tomada de consciência.  Uma assembleia sinodal que, nos seus textos finais, não ouse uma primeira palavra sobre a leitura da realidade, propondo-a, de modo necessariamente humilde e convocando todos para o seu enriquecimento e aperfeiçoamento futuros, seria uma forte deceção para quem espera iniciar, ou aprofundar, com a Igreja, um diálogo sobre o mundo em que vivemos. Esperamos que, tal como nos propõe o Papa Francisco na sua Laudato Si (publicada já depois das sessões do Escutar a Cidade), esse perscrutar possa ser redigido em linguagem comum e valorizado à luz da fé. Sem dúvida que esse impulso missionário e a leitura da realidade devem ter presente e valorizar o bem que os cristãos, as comunidades e instituições católicas já fazem. Mas fazer cada vez mais e cada vez melhor é uma exigência do Evangelho. (2) 
 
2. Prioridades diocesanas de reflexão e ação 
 
A partir das leituras de múltiplas realidades que nos foram oferecidas pelos que aceitaram o nosso desafio de nos falarem ao longo do ciclo Escutar a Cidade, ressaltam três áreas preferenciais onde concentrar a nossa atenção/reflexão nos próximos anos e a eleger como prioridades de ação da Igreja diocesana:
 
a) A erradicação da pobreza é um objetivo prioritário de toda a Igreja diocesana. 
A mobilização generosa e enérgica das instituições católicas de solidariedade e de outras organizações de ação social não foi suficiente para contrariar o aumento da pobreza e da severidade da mesma que se fizeram sentir na área do Patriarcado, tal como se passou em todo o país, durante os últimos anos.   Assumir este objetivo como prioritário implica continuar a identificar e a estudar as raízes da pobreza e as condições da sua reprodução, tendo sempre presente as repetidas afirmações da Doutrina Social da Igreja de que a pobreza não é inevitável, nem  irreversível e de que uma das tarefas fundamentais dos atores da economia é a obtenção de um desenvolvimento integral e solidário para a humanidade.  Implica também propor sem descanso o desenho de políticas públicas de luta contra a pobreza, formas novas de solidariedade dos cidadãos e iniciativas continuadas e exemplares das comunidades católicas iluminadas estas pelos princípios do destino universal dos bens e da fraternidade universal.  Buscando agir em rede com outras instituições para ser eficaz e apostando decisivamente na formação de quantos estão ao seu serviço, as organizações católicas de solidariedade não se limitem ao assistencialismo, mas pautem-se sempre por uma ação verdadeiramente sóciocaritativa: ou seja, assente na dimensão assistencial mas procurando sempre a dimensão promocional dos direitos e da justiça social à luz dos princípios e valores da Doutrina Social da Igreja. (3)  Enquanto comunidades cristãs reafirmamos a urgência de voltar a colocar a pessoa no centro da sociedade e da nossa cidade, construindo processos que combatam a cultura do descartável [4] e criem uma cultura mais inclusiva de todos, derrubando barreiras geracionais, económicas e sociais.  Um dos aspetos mais violentos da pobreza, ainda que não seja um exclusivo seu, é hoje o problema da solidão. Perante essa magna questão, temos, por um lado, de criar individualmente uma predisposição de escuta e de abertura ao outro e, por outro, de pensar socialmente o reverso da solidão, isto é, de conceber formas de solidariedade social. Não podemos esquecer que a marginalidade é produzida pelo centro e que, além de produtora de sociabilidades, a cidade é também um espaço de segregação e de exclusão. Por este motivo, o combate à exclusão social não será efetivo se não houver uma atuação sobre os mecanismos de exclusão gerados pela própria sociedade e que todos, de forma nem sempre consciente, alimentamos e reproduzimos.  A pobreza que nos propomos erradicar é ainda e em grande parte uma pobreza urbana. Para tal, aí, na sociedade urbana, é preciso contrariar as desigualdades ou assimetrias crescentes quanto à possibilidade de dispor do tempo e do espaço (5) como condição para construir futuros desejáveis, de modo a garantir um quotidiano digno a todos os cidadãos e uma vida social justa e feliz.  

b) A justiça e a participação são os novos nomes da Democracia e as Igrejas querem ser fermento delas. 
Para se compreender o nosso tempo, não se pode ignorar que a reivindicação de justiça e a exigência de participação ganharam um lugar central nas nossas sociedades democráticas. A democracia não pode reduzir a participação dos cidadãos ao exercício do voto e à intervenção partidária, antes deve permitir a multiplicação dos lugares de afirmação cívica e cidadã, desse modo possibilitando a integração de muitos que hoje são excluídos.  Neste quadro, a Igreja diocesana não é chamada apenas a identificar o que configura o presente; no seu jeito de ser fermento, ela pode e deve ser agente de justiça e de participação, exemplo de comunidade movida pela vontade de que ninguém seja excluído, promotora da participação democrática de todos ao fazer sua a voz dos injustiçados, dos maltratados e destratados da nossa cidade.   De modo mais concreto, não podemos iludir quanto a justiça e a participação foram postas em causa numa área de grande centralidade para a vida social: o trabalho. Estes anos de crise financeira e económica tiveram repercussões devastadoras sobre o mundo do trabalho. A menorização do papel atribuído às organizações dos trabalhadores e o desincentivo à participação destes na vida das suas empresas, a redução abrupta do valor do trabalho, o aumento da precaridade do emprego e o crescimento do desemprego são algumas das marcas deixadas pela crise.   Neste contexto, seguindo as repetidas exortações de João Paulo II e também as reflexões do Papa Francisco na Laudato Si (nºs 124129), torna-se imperioso revisitar os temas e as realidades do trabalho e do desemprego, colocando a pessoa e o sujeito do trabalho no centro da economia. É urgente que a Igreja da diocese proceda a uma renovada reflexão antropológica e teológica sobre o trabalho numa sociedade e numa economia que, em nome da competitividade e do “deus mercado”, desvaloriza económica e socialmente o trabalho – de tal modo que o trabalho, em muitos casos mal remunerado, já não é garantia de superação da pobreza, mas manutenção dessa condição e de aviltamento com situações de grande sofrimento.   Temos de voltar a interrogar-nos sobre se é aceitável uma sociedade em que apenas se garante trabalho a uma parte reduzida da população ativa. Será que caminhamos para uma sociedade fraturada entre os que têm trabalho, e portanto algum rendimento, e os que nunca conseguem emprego? Não será a pergunta de Deus: “Caim, Caim, onde está teu irmão Abel?” (Gn 4, 9) hoje traduzível por  “Como podemos conviver com uma realidade em que uma minoria tem bons empregos e a maioria vive sem trabalho remunerado, sem estabilidade, sem condições de dignidade?” E não será que a lógica cristã da partilha se deve também estender à partilha do trabalho, desse modo garantindo, ao mesmo tempo, a realização de cada pessoa e uma sociedade mais solidária e coesa?  
 
c) Falar as linguagens da arte, como questionamento e criação.
  Os cristãos, as comunidades e as instituições eclesiais devem particular atenção às artes, no sentido de se relacionarem com elas e delas apreenderem outros olhares. Enquanto manifestações do pulsar humano e de uma inquietação quantas vezes profética (de denúncia e anúncio), a arte e a cultura foram sempre e continuam a ser lugares essenciais da expressão da fé. Essa centralidade deve continuar e ser aperfeiçoada pelo discurso e pela prática católica. Como falar hoje das verdades de sempre com novas palavras e com tantas novas formas de expressão ao nosso alcance?  A expressão artística é, quase sempre, um lugar de questionamento, no qual se manifesta a atenção à realidade, através da criação e da recriação. Mas esse olhar sobre a realidade, de um ponto de vista cultural, não pode deixar de ser feito também a partir dos excluídos, das periferias, de quem está à margem.   Também neste âmbito, os cristãos são chamados a abrirem-se à comunidade e aos que estão “à beira do caminho” (Mc 10, 46), a habitar os espaços que outros habitam, saindo de si para construir pontes e redes em outros lugares que não apenas a comunidade cristã de referência. A atenção à criação contemporânea como lugar de reflexão sobre a condição social e humana e a relação com escolas de criação artística e instituições de cultura podem ser um caminho conducente a novos discursos em que a fé se possa dizer.  
 
3. Um novo modo de estar 
A resposta da Igreja diocesana ao que nos foi dito pelos cidadãos e cidadãs da nossa cidade não se esgota na assunção das três prioridades antes enunciadas. Para chegar aos homens e mulheres que habitam o território da diocese, as comunidades cristãs devem também procurar outro modo de estar que seja espelho do seu apego aos seguintes valores:  
 
a) Fidelidade à ideia de universalidade cristã, que implica a consciência de uma cidadania global. 

Num período de enorme gravidade na Europa, em que os acontecimentos se sucedem numa celeridade e intensidade inusitadas, a Igreja católica não pode mostrar-se cautelosa e muito menos passiva. Pelo contrário, tem o dever de promover, nas suas comunidades, espaços de debate livre e aberto sobre as questões que a iminente fragmentação e desarticulação da Europa levanta. E deve fazê-lo numa base ecuménica e inter-religiosa, com as outras Igrejas cristãs e outras comunidades religiosas, com os judeus, com as comunidades muçulmanas, com os não-crentes, num ambiente de fraternidade, não percorrido por pulsões agressivas nem por pressões de calendarização, e sem vozes mais autorizadas do que outras. Isso, que pode e deve ser feito ao mais alto nível, pode também ser feito na diocese, nas paróquias, nos grupos e movimentos.  Como no passado, e também no século XX e hoje, há uma inspiração do catolicismo na luta pela igualdade, pela liberdade e pela justiça, conceitos fundamentais do pensamento político. A voz da Igreja deve, por conseguinte, continuar a fazer-se sentir quando denuncia as injustiças, mas também pela constante referência à dimensão política do conceito cristão de perdão (como reflete Hannah Arendt), única via para se afirmar a paz e o respeito mútuo enquanto método e fim de uma verdadeira integração europeia, motivo de orgulho para todos nós e bênção para o mundo. 
 
b) Pluralidade na cidade e na Igreja. 

O envolvimento público dos cristãos, na sua necessária pluralidade, deve ser cada vez mais afirmado, a par do reconhecimento do pluralismo interno da Igreja. Para quem olha a Igreja e os católicos a partir de “fora”, a uniformidade que tantas vezes as comunidades cristãs caem na tentação de procurar exibir é mal apreciada e nada coerente com o Evangelho, pois é entendida como cerceadora da liberdade e reveladora de uma falsa unidade. A diversidade de carismas de que falava São Paulo (1 Cor, 12) deve entender-se como a possibilidade de os cristãos poderem participar em diferentes âmbitos da sociedade a partir de uma mesma fé e dela dando testemunho. (6)   Por outro lado, num mundo (e numa cidade como a nossa) que convive com tão diferenciadas expressões e modos de ser homem e mulher, a indiferença é um risco permanente. O que é urgente anunciar hoje é exatamente o de uma unidade que renuncia ao unanimismo para se construir a partir da pluralidade, de um pluralismo de urgências e caminhos que não se ignoram uns aos outros, antes afirmam como essencial o diálogo permanente e a crítica fraterna. 

c) Libertar o futuro. 

A promoção de expressões culturais e cívicas que sejam éticas e libertadoras exige o compromisso com o futuro enquanto lugar de possibilidade para todos. Só neste compromisso ativo com o futuro a humanidade responde afirmativamente ao convite de Deus. Nas últimas décadas, a lógica económico-financeira vem tomando conta de tudo, de todos e do pensamento todo, tornando a política uma mera governação/gestão acrítica dos efeitos, sem qualquer intenção ou tentativa de atuar ao nível das causas. Prolongando os seus efeitos danosos, este pensamento condiciona a produção artística e a vida cultural, ao interditá-las de imaginarem, com plausibilidade e ideal, outros futuros.   A Igreja sabe, desde as primeiras comunidades cristãs que “a fé é a substância das coisas esperadas” (Heb 11, 1) e que, sem fé ou esperança, não é possível o futuro. Isto é, só há futuro se esperamos ou acreditamos. Nós, católicos, não podemos afirmar a nossa fé sem acreditar que existe um futuro que chama pela humanidade, um futuro que não é apenas um prolongamento do presente, ou um produto do passado. É um futuro que introduz novidade e para o qual a nossa fé nos compele a trabalhar.  

d) Sublinhar a centralidade da palavra bíblica. 

Um dos aspetos mais surpreendentes nas várias sessões da dinâmica Escutar a Cidade foi ouvir diferentes intervenientes referirem-se à Bíblia e ao texto bíblico como fundamentos essenciais da sua própria construção enquanto pessoas.   Sublinhar a centralidade da palavra bíblica nas comunidades cristãs é uma urgência. A Bíblia é uma narrativa de um povo que se reconhece e constrói na sua relação com Deus; é poesia e literatura que desvela o mistério do indizível; é linguagem simbólica na aproximação ao mistério; é manifestação de Deus segundo a compreensão humana e à medida do nosso frágil entendimento. Além da sua centralidade litúrgica, a palavra bíblica deve informar/iluminar a vida das comunidades católicas nas múltiplas dinâmicas de encontro que a impulsionam: reuniões, assembleias, contextos de formação cristã...  A utilização da linguagem simbólica como expressão da beleza, não apenas com crianças, mas nas próprias comunidades e grupos, na liturgia e na assembleia cristã, deve ser cada vez mais cuidada e pensada. O papel da catequese infantil, abrindo-a ainda vez mais à participação criativa das famílias, pode ser outro caminho a explorar.  

4. Nós também excluímos 

Se a história recente da Igreja de Lisboa está cheia de gestos generosos de acolhimento e acompanhamento, não queremos esquecer quanto também nós contribuímos para a história da exclusão, não só contemporizando com formas de discriminação social e económica, mas sendo nós próprios uma Igreja que excluiu e exclui.  Não podemos desenhar a comunidade que queremos ser nos próximos anos sem tomarmos consciência das barreiras que erguemos para impedir tantas e tantos de se sentirem acolhidos e queridos nas nossas comunidades.  Assim, cabe-nos, como Igreja, recordar e pedir perdão a todos os que, por causa da nossa intolerância, colocámos à margem. Eles e elas sabem, melhor do que as comunidades a que pertencemos, como, quando e porquê foram objeto da nossa rejeição. O amor de Deus Misericordioso permita que aceitem este nosso pedido de perdão. Pedir perdão às pessoas, aos grupos e às culturas que desprezámos e excluímos ao longo dos anos, conduz-nos a uma nova consciência sobre as hábitos e os preconceitos que hoje mantemos e a que, com demasiada frequência, regressamos para os continuarmos a ignorar, desvalorizar ou estigmatizar. Coloca-nos também perante o compromisso solene de, enquanto comunidade, não ficarmos indiferentes àqueles que se afastam da Igreja. É urgente meditar sobre quanto nos interpela e questiona quem deixa de se sentir parte desejada da mesa da comunhão. Nas razões daqueles que se afastam podemos e devemos ler os erros, injustiças, imperfeições do nosso modo de ser comunidade. (7) 
 
5. Saber acolher, aceitar ser acolhida 

À Igreja de Lisboa Deus não pede apenas que seja agradável, simpática e acolhedora de todos; pede mais. Pede, como escreve o Papa Francisco, que saia, que vá ao encontro dos que estão para lá das fronteiras, dos habitantes dessas periferias desconhecidas e ignoradas. Exige mais: exige à Igreja que se ponha a caminho e seja capaz de cativar pelos seus gestos e pelas suas atitudes, em particular pela sua disponibilidade para escutar.  Neste sonho missionário de chegar a todos e de ir até às periferias, queremos não só acolher, mas sobretudo aceitar ser acolhidos. A  misericórdia e a compaixão que aprendemos de Cristo deve guiar este movimento de ir ao encontro de outros, mesmo daqueles para quem a nossa presença possa ser inesperada. Ao jeito de Jesus, que se “fazia convidado”, a presença da Igreja nos diversos lugares da cidade onde hoje se vivem todos os modos de ser homem, mulher e criança depende da disponibilidade e do genuíno interesse que esta demonstre por todas essas realidades. Dessa disposição resultará ser convidada e ser acolhida com gosto e curiosidade por quantos partilham connosco este tempo. Cabe nesta decisão o rever das prioridades de colocação de ministros ordenados e de outras formas e meios de assistência religiosa nos bairros e zonas da nossa diocese mais marcadas pela periferização. 
 
6 Os nossos concidadãos olham para Igreja com expetativa 

Queremos terminar referindo o elevado grau de expetativa que a maioria daqueles e daquelas que se nos dirigiram exprimiram em relação ao papel da Igreja diocesana e das mudanças que pressentem estarem a ser vividas pelas comunidades cristãs em todo o mundo. Motivada em grande parte pela figura e pelo pensamento do Papa Francisco, esta expetativa é para nós fonte de alegria e de maior responsabilidade, desafiando-nos à criatividade nas leituras da realidade, nas opções e nos gestos e dinâmicas a construir. Ela é um convite permanente a que não nos deixemos “encurralar nas sacristias”, dando testemunho da nossa fé nos locais de trabalho, na vida cultural, recreativa, política e associativa da nossa cidade. Ela constitui também um imenso repto à Igreja diocesana para procurar ser, com humildade e urgência, verdadeiro rosto de Deus misericordioso. 
 

Acção Católica Rural 
Associação dos Farmacêuticos Católicos 
Associação Fraternitas 
Centro de Reflexão Cristã 
Comunidade de Sant’ Egídio  
Comunidade Emanuel 
Comunidade Shalom 
Comunidade Vida e Paz 
Comissão Nacional Justiça e Paz 
Família Missionária Verbum Dei de Lisboa 
Fundação Betânia
Fundação João XXIII – Casa do Oeste
Graal
Instituição Teresiana 
Ir. Lúcia Soares – Provincial das Irmãs Doroteia
Jovens Sem Fronteiras 
Juventude Agrária e Rural Católica
Juventude Operária Católica 
Leigos para o Desenvolvimento 
Liga Operária Católica/Movimento de Trabalhadores Cristãos 
Maria da Conceição Araújo Maia – Movimento Famílias Novas (Focolares)
Metanoia – Movimento Católico de Profissionais
Movimento Católico de Estudantes 
Movimento de Apostolado de Adolescentes e Crianças 
Movimento de Encontros de Jovens Shalom 
Nós Somos Igreja 
Paróquias da unidade interparoquial de Óbidos
 Pax Christi Portugal   

Lisboa, Quaresma de 2016


NOTAS:

(1) Escutar a Cidade foi uma proposta no caminho do sínodo diocesano que teve como expressões mais visíveis seis sessões realizadas no Fórum Lisboa e múltiplas notícias e reportagens saídas em vários meios de comunicação social. Foi uma iniciativa pública promovida por mais de três dezenas de comunidades, movimentos, organizações e grupos católicos envolvidos no Sínodo da Diocese de Lisboa, aberta à participação de todos e que teve lugar durante o primeiro semestre de 2015, uma vez por mês, ao fim da tarde de uma quinta-feira.  As sessões havidas tiveram os seguintes temas e oradores:  “Identidades, comportamentos e modos de vida” – António Guerreiro, Maria Benedicta Monteiro e José Machado Pais; “Política, participação e democracia” – Ana Drago, Inês Drummond, João Pacheco e Viriato Soromenho-Marques; “Dinâmicas sociais no território da Diocese” – João Ferrão, Olga Pombo e Teresa Rodrigues; “Pobreza, emprego e crise financeira” – Fernando Alves, António Brandão Guedes, Isabel Guerra e Pedro Lains;      “Ciência, arte e conhecimento” – Maria Mota, Tiago Rodrigues, Helena Roseta, António Pinho Vargas e Inês Gil; “Linguagens, espiritualidades, sexualidades e convicções” – Ana Luísa Amaral, Telmo Baptista, Margarida Cardoso e Madalena Victorino. Os textos das intervenções, os vídeos de cada sessão e as notícias sobre o evento podem ser consultados em https://escutaracidade.wordpress.com  

(2) Na EG, e entre muitos outros apelos, escreve o Papa Francisco: “Espero que todas as comunidades se esforcem por usar os meios necessários para avançar no caminho de uma conversão pastoral e missionaria, que não pode deixar as coisas como estão.” (EG 25) 
(3) Na linha de várias afirmações (explícitas ou implícitas) de alguns dos intervenientes nas sessões Escutar a Cidade, e tendo em conta as reflexões do Papa para o Ano da Misericórdia, seria importante que a Igreja e as instituições católicas fizessem uma profunda reflexão sobre o seu papel na sociedade: este deve ser mais numa perspetiva de caridade evangélica e menos de complemento das “valências” que o Estado não pode ou não quer assumir. 
(4) Já a 28 de outubro de 2014, no seu discurso aos participantes no Encontro Mundial dos Movimentos Populares, o Papa Francisco afirmava: “Hoje, ao fenómeno da exploração e da opressão soma-se uma nova dimensão, um aspecto gráfico e duro da injustiça social; os que não se podem integrar, os excluídos são descartados, «a demasia». Esta é a cultura do descarte, e sobre este ponto gostaria de acrescentar algo que não tenho aqui escrito, mas que me veio agora à mente. Isto acontece quando no centro de um sistema económico está o deus dinheiro e não o homem, a pessoa humana. Sim, no centro de cada sistema social ou económico deve estar a pessoa, imagem de Deus, criada para que seja o denominador do universo. Quando a pessoa é deslocada e chega o deus dinheiro dá-se esta inversão de valores.”
(5) Na intervenção que fez na terceira sessão, o professor João Ferrão falou da “nova bifurcação das cidades contemporâneas”: “Muitos de nós somos verdadeiros nómadas urbanos. Ao mesmo tempo, contudo, idosos, desempregados e doentes vivem em espaços confinados, perdida a mobilidade que já tiveram por incapacidade física, impossibilidade material ou simplesmente pelo estado anímico em que se encontram. Esta é a nova bifurcação das cidades contemporâneas: os que têm espaço mas não têm tempo; e os que têm tempo mas não têm espaço. Como dar, então, mais espaço aos que têm tempo e mais tempo aos que têm espaço? Ou, por outras palavras, como garantir o direito à cidade – a usá-la e vivê-la – aos primeiros e como assegurar o direito ao tempo lento – da contemplação, da reflexão, da leitura e do convívio – aos segundos?”
(6) É o próprio Papa Francisco que, na EG, o recorda, na linha de muitos textos conciliares e do magistério: “As diferenças entre as pessoas e as comunidades por vezes são incómodas, mas o Espírito Santo, que suscita esta diversidade, de tudo pode tirar algo de bom e transformá-lo em dinamismo evangelizador que atua por atração. A diversidade deve ser sempre conciliada com a ajuda do Espírito Santo; só Ele pode suscitar a diversidade, a pluralidade, a multiplicidade e, ao mesmo tempo, realizar a unidade. Ao invés, quando somos nós que pretendemos a diversidade e nos fechamos em nossos particularismos, em nossos exclusivismos, provocamos a divisão; e, por outro lado, quando somos nós que queremos construir a unidade com os nossos planos humanos, acabamos por impor a uniformidade, a homologação. Isto não ajuda a missão da Igreja.” (EG 131)
(7) Na carta Tertio Millennio Adveniente, o Papa João Paulo II fundamentava o sentido bíblico do perdão:  “As palavras e as obras de Jesus constituem assim o cumprimento de toda a tradição dos jubileus do Antigo Testamento. É sabido que o jubileu era um tempo dedicado de modo particular a Deus. (...) No ano sabático, além da libertação dos escravos, a Lei previa o perdão de todas as dívidas, segundo precisas prescrições. E tudo isto devia ser feito em honra de Deus. Tudo quanto dizia respeito ao ano sabático, valia também para o ‘jubilar’, que ocorria no quinquagésimo ano. (...) Uma das consequências mais significativas do ano jubilar era a geral ‘emancipação’ de todos os habitantes carecidos de libertação.”  Ao mesmo tempo, referia os pecados dos quais a Igreja deveria pedir perdão, de modo a continuar o seu caminho na história e na fidelidade ao Evangelho (separações entre cristãos, Cruzadas e Inquisição, perseguições aos judeus, etc.), e apontava também os pedidos de perdão de que, na tradição do jubileu bíblico, a Igreja se deveria fazer porta-voz (perdão da dívida dos países pobres, “dificuldades de diálogo entre culturas diversas e problemáticas ligadas com o respeito dos direitos da mulher e com a promoção da família e do matrimónio) (cfr. TMA nºs 12, 34 e 51) Na mesma carta escreve o Papa João Paulo II: "O segundo milénio está a chegar ao fim, é preciso que a Igreja assuma, com uma consciência ainda mais viva, os pecados dos seus filhos recordando todas as circunstâncias nas quais, ao longo da sua história, se afastaram do espírito de Cristo e do seu Evangelho, oferecendo ao mundo, em vez do testemunho de uma vida inspirada nos valores da fé, o espectáculo de modos de pensar e actuar que eram verdadeira formas de contratestemunho e de escândalo. (...) Não pode passar o umbral do novo milénio sem animar os seus filhos a purificar-se, no arrependimento, de erros, infidelidades, incoerências e lentidões. Reconhecer os fracassos de ontem é um acto de lealdade e de valentia que nos ajuda a reforçar a nossa fé, tornando-nos capazes e dispostos a afrontar as tentações e as dificuldades actuais." (cfr. TMA nº 33). 

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